Festa de imagens O colorido, literário e eclético evento de Paraty
Fotos e texto de André Teixeira
A partir da noite de hoje, os amantes da literatura voltam seus olhos para a histórica Paraty. A cidade abriga, até domingo, a 14ª edição da Flip – Festa Literária de Paraty –, que em 2016 tem como homenageada a poeta Ana Cristina Cesar. No clima de celebração à poesia, a abertura da festa não terá o tradicional show de música, e sim um sarau. A partir de quinta, começam as mesas de debates e atividades paralelas, que envolvem praticamente toda a cidade.


Não é exagero dizer que a Flip mudou a história de Paraty. A Festa, que começou de forma quase improvisada em 2003, fruto de uma ideia um tanto arrojada de Liz Calder – uma inglesa apaixonada por literatura e Paraty, não necessariamente nesta ordem –, jogou luz não só sobre a importância e beleza da cidade, mas especialmente no quase abandono ao qual essa joia da arquitetura colonial estava relegada.



O crescimento da Flip, não por acaso, foi acompanhado por uma recuperação econômica da cidade, estimulada pelo movimento em bares, restaurantes, pousadas e no comércio em geral. Junto com a economia veio uma melhora na autoestima dos moradores, merecidamente orgulhosos da divulgação da imagem da região mundo afora, que ajudou não só a trazer mais turistas, mas também a atrair investimentos.


Falou de imagem, falou de fotografia. O evento é dedicado às letras, mas a combinação entre o casario branco com portas e janelas coloridas e as ruas de pedra cria cenários idílicos para os muitos fotógrafos que cobrem a Festa. Em dias de sol, o céu ganha um azul inesquecível. Nos de chuva – geralmente poucos, nesta época –, o colorido das sombrinhas alegra o cinza. Circulando por este estúdio ao ar livre, moradores, autores e turistas fornecem o indispensável elemento humano.


A câmera tem que ser companheira inseparável: numa mesa de bar, à noite, o escritor Gilbert Sheldon pode estar a sua frente, acompanhado do cartunista Robert Cumb. O músico e também escritor David Byrne pode resolver dar um passeio de bicicleta. O perseguido Salman Rushdie, autor de Versos Satânicos, esquece a “sentença de morte” à qual foi condenado por extremistas islâmicos e circula tranquilo pelo centro histórico, acompanhado do filho. Gay Talese, mestre do chamado jornalismo literário, enfrenta o calor sem abrir mão do impecável terno.


Com um pouco de sorte, você dá de cara com os franceses Grégoire Buillier e Sophie Calle, ex-namorados, num momento bem “ex-namorados”. O teatrólogo José Celso Martinez Correa pode aparecer na sua frente com a roupa tão branca quanto as nuvens que riscavam o céu. Uma pauta com o sociólogo e professor Antonio Cândido pode se transformar numa aula para jornalistas. E que tal encontrar a escritora argentina Pola Oloixarac arriscando seus cliques?


Nos debates, mesmo nos poucos minutos em que se pode fotografar – obrigatória e literalmente sentado no chão –, o inesperado também dá o ar da graça. E que graça: a cubana Wendy Guerra joga charme para a plateia. O norte-americano James Ellroy se agiganta diante de Arthur Dapieve, e um ousado grilo pousa no peito de Simon Schama. Na correria da cobertura às vezes há tempo para um retrato um pouco mais trabalhado, desde que o personagem se disponha, como o colombiano Fernando Vallejo, a perder alguns minutos diante da câmera.



Pelas ruas, num incansável vaivém – ou simplesmente lendo à sombra de uma árvore –, as estrelas anônimas da farra literária. Os tradicionais bonecos gigantes ganham vida; índios se misturam aos turistas ou simplesmente saboreiam uma vistosa maçã do amor. Cordelistas divulgam seus trabalhos e músicos amadores enchem de sons a Praça da Matriz, onde um casal de namorados parece fazer parte da decoração e um Coringa observa o interior de uma casa. Artistas de rua, por sinal, são uma das marcas da Flip, praticamente um clichê, assim como os cães e bicicletas que se espalham pelas ruas de pedra, vira e mexe cobertas pela água da maré alta. Mas clichês como estes – e como o da moça que quase se confunde com a escultura na janela, as bandeirinhas das festas juninas e a Tenda dos Autores refletida nas águas do Rio Perequê-Açu – também fazem parte da fotografia.



