B-analisando A des-valorização da arte urbana

Procura - se arte

Quem costuma reparar nos muros, já percebeu que a arte de rua toma novas proporções a cada dia. Nas cidades vizinhas, Petrolina-PE e Juazeiro-BA, essa realidade não é diferente, e assim como em outros lugares do país, ainda gera controvérsias. Arte, pichação ou grafite, ainda são confundidos com práticas de vandalismo. O que é permitido ou considerado crime ainda gera dúvidas. Se você visse alguém pintando uma parede de propriedade privada, qual seria sua reação? Conversar com quem estava grafitando ou compartilhar uma informação sem averiguar a situação?

Em novembro deste ano, a artista Lys Valentim foi acusada de ter pichado o muro da Celpe/Grupo Neoenergia, na orla de Petrolina. O acontecimento ganhou dimensão quando alguém que estava passando pelo local fotografou e enviou o conteúdo para um blog de notícias da cidade. Situações como essa, sem a verificação do que realmente estava acontecendo, pode gerar sérios transtornos.

“Muito se discutiu sobre o que a “menina” flagrada estava fazendo. Se era pichação ou grafite. O erro cometido não revela apenas um problema relacionado com a falta de esclarecimento das pessoas sobre o que é ou não correto, ou o que é ou não arte. Se deparar com aquela situação e achar que o que eu estava fazendo era crime, era compreensível, já que segundo a lei fazer qualquer trabalho em muro não autorizado, mesmo que realizado com fins artísticos, é considerado crime. Mas há um abismo entre achar e formar um julgamento, ainda mais quando não há provas e seu veredito coloca a integridade do outro em risco. Situações assim não revelam apenas a ignorância das pessoas, mas a falta de empatia e honestidade em tentar compreender a situação do outro antes de afirmar algo a respeito dele”, desabafa Lys.

As pinturas, através da sensibilidade de cada artista, surgem como forma de liberdade de expressão. Até 2011 a pichação e o grafite eram considerados crimes contra o patrimônio, com pena de 03 meses a 01 ano de cadeia. Mas, uma lei de maio, do mesmo ano, permitiu que o grafite consentido pelo proprietário, e feito como o objetivo de embelezar o patrimônio público ou privado, não é considerado crime.

Ronaldo Batista, 30, técnico em segurança do trabalho, costuma apreciar as intervenções. “Tem umas que acho interessante, outras são críticas de algum movimento, seja ao governo, ou à outra coisa. A gente percebe que a arte tem uma finalidade. Quando ela não viola nenhum direito, acho interessante, bastante importante para a sociedade. A gente percebe que algumas dão um visual melhor à cidade, em outras vejo certa poluição visual” conta.

De maneira resumida, o grafite constitui os desenhos que podem vir acompanhados de frases ou não. Toda a arte é idealizada e realizada de modo que a pintura represente o que cada artista sente e quer expressar. Já a pichação, é composta por letras. Geralmente manifestam através de palavras ou frases, tal sentimento ou protesto. Ambas têm o contexto social similar, cuja intervenção urbana tem a intenção de proporcionar uma reflexão a quem passa pelo local. Mesmo ganhando as ruas em todo o país, o grafite ainda é mais aceito pela sociedade e a pichação, muitas vezes encarada como prática de vandalismo. “O acontecido acabou servindo para reforçar o que as pessoas não compreendem, visto que ambas as linguagens não são crime se realizadas com autorização e que a mídia liga sempre a ação de pichar ao vandalismo, sem nunca adentrar outro nível de discussão, contribuindo para o aumento do preconceito e repressão daqueles que o praticam” analisa Lys.

Opinião

O olhar da artista

Clarissa Campello estudou pintura em 1996 no curso de Belas Artes da UFRJ, onde permaneceu durante cinco anos e, após concluir mestrado e doutorado em Linguagens Visuais, começou a misturar um trabalho experimental com pintura e a fazer arte urbana. Cansada do caos urbano do Rio, decidiu fazer o concurso para o curso de Artes Visuais da Univasf, em Juazeiro-BA, onde começou a trabalhar como professora de pintura em 2013. Nesse mesmo período, criou junto com alunos um grupo de intervenção urbano chamado "Cópia", que não tem esse nome por acaso: a ideia do grupo é reproduzir intervenções feitas por outros artistas. Além do grupo, Clarissa criou a disciplina eletiva Arte Urbana, que recebe estudantes de vários cursos com o objetivo de produzir arte urbana em Juazeiro.

Foto: Reprodução Facebook

Vivemos em uma sociedade que pede agilidade. Como você vê isso com relação a arte?

Não gosto dessa velocidade como as coisas hoje em dia são feitas e são destruídas muito rapidamente. Esse excesso de imagem, de informação, é cansativo pra mim. O artista vai à contra mão de tudo. Como eu trabalho com pintura eu sempre penso nisso, trabalhar com pintura é quase um protesto diante dessa velocidade que as imagens são produzidas, consumidas e descartadas. Espera aí gente, para um pouco, vamos olhar para as coisas com mais calma.

Como as pessoas recebem as suas intervenções, elas respeitam esse espaço da arte?

Varia, a gente fez um submarino colorido e depois o pessoal foi lá e colou um cartaz em cima e eu arranquei. Então, tem uma insensibilidade das pessoas em não preservar, mas eu acho que é a minoria, a maioria geralmente gosta.

Você avisa ou pede permissão para pintar os muros, a prefeitura se envolve nesse processo?

Eu uso um lema do Banksy, até ensino isso para os meus alunos. "É mais fácil você conseguir o perdão do que a permissão". Acontece o seguinte, se você for pedir permissão raramente vai encontrar uma pessoa que diga sim, porque quando diz sim ela coloca a responsabilidade nas costas e se der algum problema ela que responde. Então eu prefiro responder, se der algum problema eu respondo. Prefiro fazer assim. Mas, há casos que peço autorização quando acho que pode dar algum problema.

Essa questão dos cartazes é realmente um problema da cidade. Como você vê essa interferência abusiva das propagandas, inclusive nas intervenções?

A cidade está tomada por publicidade e não deixa de ser um recado que é dado à comunidade, através de palavras e imagem ela ocupa a sua mente. Só que geralmente a mensagem é idiota, eles não conseguem falar alguma coisa que chegue de verdade pra gente. Fico me perguntando se publicidade pode ser arte, mas por mais criativo que seja o quebrando alguns padrões de beleza, questionando, sendo mais filosófico na abordagem... No fundo a mensagem dele é sempre um imperativo, uma ordem que ele está te dando para fazer uma coisa e deixar de fazer outra. Você não pediu para ver e é obrigado, isso causa uma saturação. É uma poluição visual com uma mensagem que é repetitiva e infernal. publicitário, por mais interessante que ele consiga fazer a propagada, às vezes até

Em sua opinião qual é o papel social do artista?

O artista já foi muito mais importante que o papa. Na época do Renascimento o papa ficava de joelhos pra Michelangelo "Por favor pinte a capela cistina". Na modernidade o artista já está um pouco deslocado por causa da industrialização e ele vai perdendo esse papel de pensador e construtor da cidade. O arquiteto era um artista virou um engenheiro e engenheiro é isso... tempo é dinheiro, bloco, pilha, um caixote e a funcionalidade. Mas a pós-modernidade está indo um pouco contra, está voltando a pensar uma cidade mais orgânica feita construída para as pessoas e não para as maquinas. Acho que toda a cidade tem que ser remodelada para pensar no desenvolvimento que é mais orgânico mesmo, e aí talvez o artista reapareça nessa sociedade de forma mais humana porque ele trata das relações humanas, fala de amor. Quem fala de amor na nossa sociedade? Só o artista.

Galeria de arte?

Orla de Petrolina

Petrolina antiga

Orla de Petrolina

Orla de Juazeiro

Orla de Petrolina

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Trabalho produzido por alunos do 6º período do curso de Jornalismo em Multimeios da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), para a disciplina de Jornalismo Online, orientado pelo professor Cecilio Bastos.

Produção: Andressa Silva, Bruno Rosa, Danilo Borges, Giúllian Rodrigues, Jacira Felix, Leonardo Costa, Rodolfo Rodrigo

Fotos: Andressa Silva, Bruno Rosa e Danilo Borges

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