Nos dias de hoje, quem pelo Parque D. Carlos I, nas Caldas da Rainha, vaguear irá deparar-se com um imponente edifício de aspeto degradado e aparentemente nunca acabado. Vidros partidos, papeis e excrementos de pombo abundam nas salas que nunca chegaram a desempenhar as funções para as quais foram desenhadas.
Os Pavilhões do Parque são talvez o edifício mais icónico da cidade das Caldas da Rainha, no entanto, o seu propósito nunca foi realmente servido. Em tempos, albergou diversas instituições. Agora, apenas a fraca brisa e os ocasionais visitantes que conseguem trespassar o edifício trancado percorrem os corredores dos três pavilhões.
Na segunda metade do século XIX, tanto em Portugal, como no resto da Europa, o termalismo atraía um grande número de aquistas (pessoas que fazem uso de águas termais). Caldas da Rainha não era exceção - conhecida como cidade termal, juntava visitantes portugueses e estrangeiros que usufruíam das benéficas águas.
Com a construção da Linha ferroviária do Oeste, em 1887, a circulação entre Caldas da Rainha e a capital era simples. Surgiu então a ideia de modernizar as instalações termais.
No inverno de 1888, Rodrigo Berquó chega à vila das Caldas da Rainha para tomar as rédeas da administração do atual Hospital Termal Rainha D. Leonor. No entanto, Berquó havia sido contratado em 1884, muito antes de ser nomeado administrador do Hospital. Este pretendia construir de raiz um hospital dentro do parque que pudesse atender às necessidades que se impunham. Para além disso, foi também encarregue da recuperação do antigo Passeio da Copa, o atual Parque D. Carlos I. O objetivo era revitalizar a zona criando um espaço de lazer, no qual seria possível praticar inúmeras atividades (o parque), e dentro deste o Hospital Termal a desempenhar também as funções de hotel. O projeto foi criado entre 1891 e 1892, e quando Berquó o propôs não fazia de que seria nomeado para o cargo que desempenhou.
O novo Hospital conteria serviços de internamento de acamados e de hospital de dia para doentes de ambos os sexos e diferentes classes sociais. Este separar-se-ia do Estabelecimento Balnear, para que fosse considerado um género de estância.
O primeiro projeto integrava a remodelação da Casa da Convalescença, sendo ainda criada uma ligação coberta entre este edifício e o estabelecimento balnear - isto facilitaria a circulação dos aquistas entre o local de tratamento e o seu alojamento. Para além disto, o edifício era compacto.
Em junho de 1892, o parque foi inaugurado e recebeu o nome pelo qual ainda hoje é conhecido: Parque D. Carlos I.
Nesse mesmo ano, o projeto, já alterado, foi aprovado. Na segunda versão, após várias alterações, a área exterior entre pavilhões tinha um espaço de 9,50 metros. A fachada da Casa de Convalescença passaria a ser a entrada principal do Hospital, tirando partido da sua localização no Largo da Copa, atual Largo Rainha D. Leonor.
A 14 de março de 1893, o rei D. Carlos I coloca a primeira pedra do Novo Hospital. No entanto, isto não deu início às obras – as condições monetárias e materiais necessárias ainda não estavam reunidas – estas só começariam em 1894. Foi no dia 18 de junho que Berquó informou o Presidente da Câmara a intenção de iniciar a construção.
A agosto de 1895, já o empréstimo anual à Caixa Geral de Depósitos, no valor de 50 contos de reis, se gastara. O final das obras estava previsto para o ano seguinte, mas estas não poderiam continuar sem os fundos necessários. Apesar de todos os esforços, a obra não chegou a ser terminada.
Nunca foram concluídos o Observatório Meteorológico e o corpo destinado a doentes com mobilidade reduzida. A tão desejada renovação da Casa de Convalescença também nunca chegou a avançar. Os pormenores ficaram também incompletos – os medalhões figurativos e as esculturas previstos na segunda versão do projeto (as representações da Rainha D. Leonor e D. Carlos I).
Entre 1901 e 1902, Caldas da Rainha acolheu mais de 300 refugiados bóeres do conflito Anglo-Boer na actual África do Sul – eram homens, mulheres e crianças que fugiam ao conflito. Estes conseguiram integrar-se facilmente na vila até à chegada da paz, a 31 de maio de 1902. Inicialmente, foram alojados no Hospital Termal, mas com o início da época termal foram transferidos para os Pavilhões do Parque. Alguns optaram por alugar quartos ou casas na vila. A guardá-los estavam alguns militares que estavam também alojados nos pavilhões.
Nos 40 anos seguintes Caldas da Rainha viria a acolher mais duas vagas de estrangeiros: os detidos alemães durante a I Grande Guerra e os refugiados (na sua maioria judeus) da II Grande Guerra.
Em 1917, foi criada uma comissão com a intenção de estudar a melhor forma de se proceder à separação entre o Hospital e o Balneário, permitindo o arrendamento de alguns equipamentos e dependências da instituição.
Em 2019, os Pavilhões que serviram de casa a tantas pessoas e instituições apenas nos mostram a vida que em tempos ali andou. Pelo chão, encontramos os restos dos moradores que por aqui passaram. O que acontecerá no futuro só a Câmara Municipal poderá eventualmente revelar. No horizonte há o projeto para transformar o edifício num hotel. Neste momento, a beleza do abandono espreita em todas as salas e a história que nelas se encontra anseia por ser explorada e contada.
Pavilhões do Parque D. Carlos I - Fotogaleria:
Credits:
Sara Tomé